Família e empresa
– duplo desafio
Vera Maria Carvalho
Psicóloga,
Coordenadora de projetos e de desenvolvimento de pessoas da Nova Forma –
Assessoria e Desenvolvimento.....vide currículo no
final do texto.
Entendendo família como um todo
organizado em níveis hierárquicos formados por partes interdependentes, que
influenciam e são influenciadas, podemos também pensar sobre o que ocorre na
relação do sistema familiar em uma empresa pertencente a uma mesma
família. Será que os filhos desejarão
continuar com o negócio que o avô criou e que a atual geração – os netos -
demonstra não mais querer mantê-lo?
As diferentes configurações familiares
na atualidade demandam variadas tarefas aos subsistemas que formam o sistema
familiar e este aos seus membros. A abrangência dos subsistemas é grande e vai
do estabelecimento de vínculos até a sua manutenção para funcionamento saudável
da família. Embora haja diferentes configurações familiares, nos deparamos
sempre com o modelo tradicional que consta de subsistema individual, subsistema
conjugal, subsistema parental, subsistema filial e subsistema fraternal,
acompanhados de funções específicas e dependendo de que contexto e cultura
estejam inseridos.
Na formação das empresas familiares a
configuração do sistema se depara com três subsistemas específicos: família,
patrimônio e empresa (Passos, Bernhoeft e Teixeira – Família, Família, Negócios
à parte – Editora Gente, pág. 49 - 2006:)
Compreender o funcionamento desta
arquitetura e sua dinâmica é fundamental para que a família, também empresária,
tenha condições de administrar o negócio e as relações pessoais familiares. Nem
sempre os membros da família participam diretamente das atividades da vida
empresarial. Há famílias com membros que chegam a ignorar o trabalho que é empreendido
na empresa de onde sai, por exemplo, o dinheiro para o pagamento de suas
despesas com escola, carros, viagens.
O conceito de empresa familiar é
aquela em que o controle é exercido por uma ou mais famílias, ou seja, os
principais sócios da organização são os fundadores ou os seus descendentes.
Portanto, um sistema que tem como característica o controle societário implica,
também, em relações de negociação sobre interesses pessoais dos membros daquela
família.
Nem sempre o que o pai quer, ou a mãe
sonha é compartilhado ou aceito pelo filho mais velho, a filha que deseja ser
independente ou o caçula que quer ser, por exemplo, peão em rodeios de touros.
Algumas vezes as relações de negociação se complicam mais quando entra em cena
o genro ganancioso, a nora que quer mudança de “status” social, ou o filho que
deseja, a todo custo, tirar o pai da administração do negócio da família, para
imprimir a ele o seu estilo, com acertos e possíveis erros, o que ninguém
aceitaria sem antes ensejar discussões, brigas e desentendimento entre os
sócios, membros da família.
A existência simultânea e a interação
dos três subsistemas da empresa familiar fazem com que a dinâmica das
sociedades familiares enfrente questões de ordem emocional, legal, patrimonial
e empresarial, influenciando também a dinâmica da família. Cada um dos
subsistemas – família, patrimônio e empresa - atua nos membros da família de
forma distinta, dependendo do seu grau de envolvimento nas atividades da
empresa e/ou no seu papel funcional na família.
O grande desafio dos membros da
empresa familiar que atuam direta ou indiretamente na sua administração reside
na delimitação das fronteiras entre o papel familiar e o papel profissional. Um
duplo desafio: o de manter a empresa e seu negócio e o de manter as relações
familiares sem conflitos.
Muitas vezes estes conflitos aparecem
quando não há a delimitação do que é profissional e do que é familiar. Quando o
pai-empresário age como administrador os membros da família podem questionar
que a decisão tinha que ser apenas como pai. Noutras decisões, quando o
empresário-pai age como pai, o filho pode se sentir desqualificado enquanto
profissional e integrante da administração da empresa. Nas duas possibilidades,
sempre haverá interferência do que é familiar com o que é apenas empresarial,
profissional por excelência.
Quando há um conflito entre estes
aspectos, o pai pode agir como empresário e magoar o filho que se mostra apenas
filho, ou quando o filho é tratado como se fosse apenas filho, sendo
desqualificado como profissional que também é. Isto pode acontecer, também, nas
relações conjugais. O marido quer a empresa numa direção e a mulher, noutra. Em
casa, há uma ampliação do impasse e as relações marido-mulher se estremecem. No
final da história, empresa mal administrada e casal insatisfeito.
Facilmente as queixas se repetem em
diferentes empresas familiares e nas famílias com relação ao espaço de
autonomia, o reconhecimento das competências profissionais dos seus membros, os
estilos e modelo de gestão adotado e os sentimentos que se misturam às decisões
empresariais interferindo nas relações pessoais, tornando frágeis os vínculos e
levando as pessoas a conflitos maiores, chegando até, ao rompimento ou
afastamento da empresa e o estabelecimento de mágoas familiares de difícil
reparação.
O duplo desafio que as empresas
familiares enfrentam - ser competente e rentável no mundo dos negócios e
proporcionar bem-estar e felicidade para todos os membros da família –
necessita de ações conjuntas que promovam a valorização coletiva dos membros
que participam daquele sistema a partir de recursos da própria família e seu
funcionamento ou de recursos externos que os auxiliem a compreender a dinâmica
familiar na administração da empresa, neste caso, com a contratação de profissionais
especializados em consultoria e assessorias específicas que tenham visão
sistêmica sobre o funcionamento geral da empresa e as diferentes áreas que a
compõem. Nem sempre o esforço interno é eficaz na resolução dos conflitos, e
por uma atitude tardia, em busca de ajuda, a empresa poderá ter prejuízos
financeiros e patrimoniais assim como a família pode estabelecer um sofrimento
permanente.
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